- Somos loucos por amor a Cristo (1Co 4.10,11). Este contraste vem
repassado de ironia e observações incisivas, pois era manifestamente
intolerável, e deveras absurdo, que os coríntios fossem felizes em tudo e
usufruíssem de fama segundo os padrões humanos, e ao mesmo tempo assistissem
seu mestre e pai sofrer misérias provocadas pelos infortúnios externos e
problemas de todo gênero. Há quem pense que Paulo se humilha desta maneira para
que pudesse de alguma forma confiar na seriedade dos coríntios e ter as coisas
que, como admite, ele mesmo não possuía. Aqueles que defendem este ponto de
vista podem ser facilmente refutados à luz da pequena cláusula que vem
imediatamente em seguida.
Portanto, ele está
sendo irônico em admitir que os coríntios são sábios em Cristo, fortes e
ilustres. É como se dissesse: "Vós desejais manter a reputação de sábios
junto ao evangelho, ao passo que eu só fui capaz de vos pregar Cristo ao
tornar-me louco aos olhos do mundo. Ora, quando me disponho em ser um louco ou
gozar de tal reputação, pergunto se é justo que desejeis ser considerados como
sábios. Dificilmente teríeis condição de afirmar que estas duas coisas vão bem
juntas, a saber: que eu, que tenho sido vosso mestre, não passo de um louco por
amor a Cristo, enquanto que vós permaneceis sábios." Segue-se que ser
sábio em Cristo não alcança boa conotação aqui, porque, na verdade, eles
queriam associar coisas que são completamente dissemelhantes.
O raciocínio nas frases
que se seguem é similar: "Vós sois fortes" diz ele, "e
famosos"; em outras palavras, "vos gloriais nas riquezas e recursos
do mundo, e não podeis tolerar a ignomínia da Cruz. Entrementes, é razoável que
eu seja obscuro e desprezível, e sujeito a muitas enfermidades na busca dos
vossos interesses?" Mas esta queixa não leva nenhum respaldo da dignidade,
porquanto, na verdade, ele não é um indivíduo fraco e desprezível entre eles.
Resumindo, ele moteja da vaidade deles, porque as coisas viram de ponta-cabeça
quando se esperava que os filhos e alunos se tornassem famosos e renomados,
enquanto os pais permaneciam na obscuridade, e igualmente expostos a todos os
insultos do mundo.
Até à presente hora.
Aqui o apóstolo pinta um quadro vivido de suas circunstâncias pessoais, para
que os coríntios aprendessem de seu exemplo a desistir de seu orgulho e a
submeter-se de coração, e a abraçar a Cruz de Cristo juntamente com ele. Ele
revela consumada habilidade, pois, ao lembrá-los das coisas que o transformaram
num ser abjeto, ele estabelece sua ímpar fidelidade e sua infatigável
solicitude em disseminar o evangelho; e, por outro lado, tacitamente censura a
seus rivais que, sem apresentar quaisquer evidências, esperavam, não obstante,
usufruir de um lugar de preeminência.